A primeira delegacia de polícia especializada no atendimento de pessoas com deficiência do país foi criada nesta sexta-feira (3/1) com a assinatura de decreto pelo governo de São Paulo. Além de prevenir e reprimir crimes contra essa população, a unidade funcionará como um centro para recebimento, compilação e difusão de dados e denúncias sobre atos de violência contra pessoas com deficiência.
A delegacia, que deve iniciar os trabalhos em até 45 dias, contará com uma equipe multidisciplinar composta por assistentes sociais, psicólogos e intérpretes de libras, além de policiais capacitados para a atividade.
“O objetivo é aperfeiçoar o atendimento, capacitar a própria polícia para ter uma abordagem melhor desses casos e também estimular a ampliação das notificações de casos”, declarou Luiz Carlos Lopes, coordenador de Desenvolvimento de Programas da Secretaria Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência.
De acordo com o órgão, nos últimos dois anos foram registrados 1,3 mil ocorrências de violações contra esse segmento. A população de pessoas com deficiência é composta por 9 milhões de habitantes em todo o estado, sendo 3 milhões só na capital.
O coordenador acredita, no entanto, que haja uma subnotificação dos casos de violência. “As pessoas não se sentiam estimuladas a ir a uma delegacia para fazer uma denúncia, e são vários os motivos”, disse.
Entre as razões para esse distanciamento, ele destaca as dificuldades físicas, agravadas pela falta de acessibilidade das delegacias; problemas de comunicação, a exemplo de pessoas surdas; e descrédito de denunciantes com deficiência intelectual. Somado a isso, Luiz Carlos aponta ainda a falta de um olhar adequado, por parte do agente policial, para esse tipo de atendimento.
Negligência e abandono são os casos mais comuns, representando 32%. Em seguida, estão as situações de violência psicológica, com 29%, e as agressões físicas (20%). Existem ainda os conflitos por abuso econômico (12%) e sexual (4%).
Para o coordenador, o fato de que pelo menos 74% dessas ocorrências são praticadas por membros da família reforça a necessidade de promover a autonomia das pessoas com deficiência na hora de fazer uma denúncia. “Muitas vezes o próprio agressor é quem leva para a delegacia”, relatou.
Entre as tecnologias que estarão disponíveis na unidade, o software para leitores de tela de computador vai permitir que uma pessoa cega assine o depoimento somente depois de ouvir a leitura do texto, sem que isso seja feita por terceiros.
Pessoas surdas poderão recorrer, por exemplo, aos intérpretes de libras para que não fiquem sujeitos à interpretação de um parente. “Além de recursos menores, mas que auxiliam no momento da assinatura de um documento. Não necessariamente de alta tecnologia, mas que facilitam a comunicação”, disse.
Além desses recursos, o coordenador destaca a presença da equipe multidisciplinar, tendo em vista que muitos casos requerem uma abordagem mais ampla, com viés social, e não apenas criminal. Nesse sentido, poderão ser feitos encaminhamentos para a área de assistência, que ajudem a pessoa com deficiência a se inserir na rede de proteção e, assim, assegurar direitos.
Da mesma forma, Luiz Carlos avalia que a família também deve ser assistida. “Pode ser algo pontual, fruto de uma situação familiar até por conta do estresse por que passa o cuidador. Não basta prender, você pode ajudar essa pessoa a superar essa situação”, avalia.
O coordenador acredita que essa iniciativa vai servir como modelo para orientar outras unidades policiais a adotarem novas abordagens com esse público. “Uma só [delegacia] obviamente não vai dar conta de todos os casos. Uma das tarefas principais dessa unidade é disseminar esse olhar diferenciado”, disse.
Nesse sentido, serão feitos cursos de capacitação com policiais de outras unidades, além do que, os profissionais da delegacia especializada estarão disponíveis para prestar auxílio. “Sem contar no trabalho, que já começou, de adequação arquitetônica nos outros distritos policiais”, acrescentou.
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